Corte de Cabelo à Hora Ideal


Provavelmente o nome japonês Jujiro Matsuda pouco lhe dirá, pois a não ser que tenha algum conhecimento do sector automóvel, poderia levá-lo a pensar em algum político ou empresário nipónico que nos visitasse ou, agora que andamos em fase quente de contratações futebolísticas, num reforço para uma qualquer equipa nacional. Mas não! Matsuda foi alguém que, se não tivesse entrado uns minutinhos antes num barbeiro do que um outro cliente teria alterado parte bastante significativa do meu percurso profissional!




Passo a explicar: Hiroshima fez, pelas 8h15 da manhã do passado dia 6 de Agosto, um minuto de silêncio em memória dos milhares de vítimas da bomba atómica que, em 1945, no epílogo da 2ª Guerra Mundial, foi lançada sobre esta metrópole japonesa. Já muito se explorou sobre esta bomba, de seu nome “Little Boy”, caída dos céus da cidade a partir do bombardeiro B-29 “Enola Gay”, mas o que a maioria não saberá é que houve alguém, de seu nome Jujiro Matsuda, que sobreviveu a esse inferno, permitindo que eu hoje possa estar a escrever sobre uma marca automóvel chamada Mazda e a si, caro/a leitor/a, ter, eventualmente, um exemplar parado à sua porta! 

Esta é, por isso, a história de um japonês que em 1921 começou por comprar uma fábrica de cortiça, com apenas um ano de actividade chamada Toyo Cork Kogyo Co., Ltd e que 10 anos depois a transformou noutra – a Toyo Kogyo – para produzir ferramentas e… viaturas! Alguém que, naquele trágico dia 6 de Agosto de há precisamente 70 anos, apressou o passo para entrar no seu barbeiro habitual à frente de um outro cliente e, com isso, sobreviveu ao bombardeamento. Eram 7h30 quando ali entrou, para meia hora depois, já de look corrigido, seguir para a sua empresa, instalações que ficavam num dos extremos da cidade. Mais um quarto de hora passou e o inesperado engenho mortífero deflagrava metros acima do espaço onde, minutos antes havia estado sentado em tal operação de cosmética! O seu efeito devastador é por demais conhecido e recordado, integrado num período da História repleto de horrores! 

Apesar do enorme impacto da explosão na viatura em que seguiam, Matsuda e o seu chauffeur terão sofrido apenas alguns ferimentos, algo que se estendeu à sua própria fábrica, que semi-protegida por uma zona montanhosa que a separava da cidade, poucos danos teve, comparativamente aos de outras infra-estruturas que se viram pulverizadas por completo da face da Terra! 

Quanto a esta singular e quase desconhecida história, de alguém que cortou o cabelo à hora certa e sobreviveu para a relatar, descobri-a por mero acaso no portal da Automotive News, levando-me a contactar uma fonte oficial da Mazda para saber da sua veracidade. E era, de facto, uma história bem guardada nos anais da empresa, uma de entre centenas de outras semelhantes que, decerto, haverão por aí, resultantes deste ou de outro conflito bélico, ou de outra qualquer situação oferecida pela natureza ou provocada pelo Homem.





A título de informação adicional, só em 1984, 32 anos após a morte de Matsuda, a Toyo Kogyo se transformou em Mazda Motor Corporation, numa altura em que todos os modelos da marca já se chamavam Mazda. Um nome que se diz ter duas origens: uma por derivação da expressão “Ahura Mazda”, onde o sentido literal da palavra “Ahura” é “luz” e de “Mazda” é “sabedoria”, inerentes a uma religião da Ásia Central, com múltiplos deuses, fundada na antiga Pérsia; mas a empresa também diz que deriva do nome do seu fundador, Jujiro Matsuda. Vá lá… tente verbalizar a palavra como “Mátzda” (é o modo correcto de se dizer “Mazda”). Viu como é fácil? 

Ao longo dos seus 95 anos, produziu várias dezenas de viaturas, muitas apenas “para japonês ver”, enquanto outras se tornaram ícones mundiais. Começou, em 1931 pelo triciclo motorizado Mazdago (à esquerda, na primeira foto deste texto), mas depois vieram o R360 Coupe (1960), o Mazda Cosmo Sports (1967) ou o desportivo RX-8 (2003), entre muitos outros.




Mas a “menina dos olhos” da marca japonesa é, sem sombra de dúvida, o Mazda MX-5, um “dois lugares” nascido em 1989 para fazer frente às propostas de reputados construtores britânicos como a MG, a Triumph ou a Morgan, bem como a geração “Z” da rival caseira Nissan e que se tornou num portento desta indústria. 

E conseguiu-o! Ao longo das suas primeiras três gerações (foto acima), o MX-5 ascenderia ao patamar de “roadster mais vendido do mundo”, tendo direito a duas certificações por parte do Guiness Book of Records. É já este mês que chega ao mercado a sua 4ª geração (foto abaixo), com que facilmente se irá atingir a fasquia de 1.000.000 de unidades! De acordo com dados oficiais de Março último, o número de MX-5 produzidos já ascendia a 942.425 unidades, pelo que com o a produção do novo MX-5 já a decorrer para os diversos mercados mundiais, é apenas uma questão de tempo!

Fotos: Mazda (oficiais)




Entretanto, se quiser conhecer parte da História da Mazda sem ter de ir a Hiroshima, pode fazê-lo pela plataforma Google Maps com Street View. Navegue pelo Mazda Museum com cobertura de 360 graus e, se se sentir conquistado, planeie uma viagem até ao oriente, sem se esquecer de fazer a reserva de bilhetes para este espaço situado na sede da marca. 

Voltando ao tema inicial, uma coisa é certa: se Matsuda se tivesse atrasado na chegada à barbearia, era bem provável que a Mazda hoje não existisse, o que condicionaria grande parte do que fiz e faço na minha vida. Como, por exemplo, este texto…! 

Cumprimentos distribuídos irmãmente e até breve! 

José Pinheiro 

Notas: 1) As opiniões acima expressas são minhas, decorrentes da experiência no sector e de pesquisa de várias fontes. Os restantes membros deste ‘blog’ não têm obrigatoriedade de partilhar dos mesmos pontos de vista; 2) Direitos reservados das entidades respectivas aos ‘links’ e imagens utilizados neste texto, conforme expresso.

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