Do Fundo dos Túneis Para o Fundo do Mar

É salutar que se lute pela preservação do planeta, numa altura em que os oceanos contam com milhares de milhões de toneladas de plásticos e outros detritos, conforme provam os relatórios das diferentes organizações ambientais, entregues às autoridades (alegadamente) competentes mas que, depois, demoram eternidades a decidir e a implementar normas realmente eficazes de supervisão. No quadrante oposto temos outras que atiram para o oceano, de modo controlado, coisas que o Homem já não usa, com vista à sua transformação em recifes artificiais, algo que a Mãe Natureza depois se encarrega de adaptar de modo ímpar!




Vem isto a propósito do recente anúncio de que vão ser afundadas duas corvetas da Marinha Portuguesa que já não estão ao serviço da nação e que, num processo normal, iriam parar à sucata. Uma delas – a NRP General Pereira d’Eça (com a referência F 477 na amurada) – vai ser afundada nos mares da ilha de Porto Santo em 2016, criando-se um autêntico museu subaquático e um pólo de atracção turística na área do mergulho amador. Fantástico! 

Mas… e que tal se a Comboios de Portugal, a Metropolitano de Lisboa ou a Metro do Porto pensassem em algo assim? Decerto há material circulante que, finda a sua vida útil, poderá ter destino semelhante. Isto porque lá fora – é inevitável o eterno paralelo com exemplos estrangeiros… – há quem o faça já há muito, com resultados esmagadores. Senão veja-se o que a Autoridade de Transportes Metropolitanos dos EUA faz há mais de uma década, afundando no Oceano Atlântico carruagens de metro da cidade de Nova Iorque.

Fotos: Stephen Mallon
O processo conta com a participação de diversas entidades e está documentado pela lente do fotógrafo profissional Stephen Mallon, depois de três anos de acompanhamento das várias das viagens das barcas que levaram material desactivado, entretanto, despido e limpo de conteúdos nocivos ao ambiente, até ao seu destino final. Veja-se este conjunto de imagens do projecto “Next Stop Atlantic”. 

Desprovidas de todos os elementos supérfluos – motores, rodas, sistemas hidráulicos, bancos, vidros, iluminação e cablagens, bem como os gases dos sistemas de ar condicionados, entre outros elementos nocivos – são já mais de 2.500 as carruagens afundadas em diversos pontos do Atlântico. Com o passar do tempo, os diferentes organismos marinhos ligam-se às armações, transformando-as gradualmente em corais, promovendo uma saudável evolução da biodiversidade em meio aquático. 

Acrescente-se que se as fotos de Mallon são, já por si, bastante elucidativas, este vídeo, um pouco mais antigo, complementa-as na perfeição.


Pedidos comentários às três entidades portuguesas acima, com material circulante com potencial de ter destino semelhante, apenas a Comboios de Portugal respondeu ao Trendy Wheels, através do seu Gabinete de Comunicação Institucional. Ana Portela disse-nos não ser prática da CP esta solução, preferindo a empresa “procurar compradores interessados no reaproveitamento ou reutilização dos veículos ferroviários retirados da operação. Quando isto não é possível, o destino deste material é a venda para desmantelamento e reciclagem, sempre feita por empresas credenciadas pelo Ministério do Ambiente, para garantir o correcto e seguro tratamento dos materiais e elementos envolvidos, sem prejudicar o ambiente”.

Quanto a uma solução semelhante à nova-iorquina, aquela responsável explica que “o afundamento de material no oceano é uma operação de elevada complexidade, pelo eventual risco de contaminação das águas por elementos como, por exemplo, cadmio, crómio e mercúrios que muitas vezes estão presentes nestes veículos quer ao nível das pinturas, quer dos restantes componentes,” acrescentando que o material da CP nestas circunstâncias “é muito antigo, pelo que é difícil garantir que a sua composição não contém os elementos acima referidos”. Isto para além da questão financeira, já que “para obter garantias fiáveis a esse nível, seria necessário realizar estudos da sua composição que têm custos elevados, aos quais acresce ainda o custo envolvido nas próprias operações de deslocação e transporte para afundamento. A CP está obrigada a um controle orçamental muito rigoroso, pelo que não dispõe de recursos financeiros para suportar este tipo de despesas”. 

Pode ser que um dia, quando a saúde financeira das nossas empresas estiver mais aliviada dos cortes orçamentais que lhes têm sido impostos, consigamos assistir ao afundamento controlado de carruagens da CP ao largo da costa portuguesa! A acontecer, o blog Trendy Mind irá tentar estar, decerto, presente!

Cumprimentos distribuídos irmãmente e até breve!

José Pinheiro

Notas: 1) As opiniões acima expressas são minhas, decorrentes da experiência no sector e de pesquisa de várias fontes. Os restantes membros deste ‘blog’ não têm obrigatoriedade de partilhar dos mesmos pontos de vista; 2) Direitos reservados das entidades respectivas aos ‘links’ e imagens utilizados neste texto, conforme expresso.

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